Divulgação informativa e cultural da Escola Secundária/3 Camilo Castelo Branco - Vila Real

quinta-feira, 21 de junho de 2012

PROJETO DE EDUCAÇÃO SEXUAL DO 10ºG

Os alunos do décimo ano de Artes Visuais realizaram ilustrações para as Histórias que criaram sobre o tema do seu projeto, o Aborto. Inspiraram-se nas ilustrações da pintora Paula Rego realizadas entre 1997 e 1999 para a série "Aborto".
Para ver e refletir...´



Havias - me dado este lenço… Este que carrego na cabeça como fardo árduo do nosso amor passado. Suja, fria, outrora, esta casa estava repleta de algo que defini como paixão. Paixão que nunca foi mais que mera ignorância, crueldade, frieza. O silêncio persegue-me após os prantos de dor, lágrimas que escorrem como ribeiros livres, sangue, como mar morto que se expandirá sobre a minha cama, sobre a minha alma.
Tudo começou no campo. Pleno verão, campos sem fim na minha aldeia. Tua nunca foi. Chegaste como turista, grande empreendedor. As minhas mãos, sujas do trabalho no campo, apertavam as tuas, tão limpas.
A partir desse dia, continuamos a ver-nos. Eu trabalhando e tu, nesse pedestal de aristocrata “gentleman”, patrão. Disseste que me amavas pelos meus olhos pretos que te lembravam a escuridão de uma noite. E essa noite aconteceu, apenas uma. Tão duro o meu destino que deixei em sorte aos deuses… nessa noite. A minha ignorante alegria! Como pude eu ficar alegre por carregar no ventre a nossa junção?!...
Partiste. Fugiste de tudo aquilo em que tinhas criado raízes. Arrancaste-as, com as tuas próprias mãos tão limpas, que outrora me tocaram como nunca antes havia algum homem feito. Tinhas sido tu a razão para que os meus olhos pretos se transformassem em estrelas, que nessa escuridão houvesse um brilho, um motivo.
Mas eu era apenas uma entre muitas que deixavas apenas por serem trabalhadoras, apenas por lavrarem os campos infinitos com as mãos, apenas por levarem com a chuva, a lama, o adubo… Mal soubeste do pobre que no meu ventre crescia, tal rebento…Partiste. Nada deixaste, levaste talvez a esperança e o meu amor. Tal qual herbicida, partiste.
Como raízes que arrancaste da terra, também eu arrancarei este rebento. Também eu arrancarei a minha única felicidade, este ser que poderia transformar a escuridão em luz. Também eu vou arrancar este amor!






Chama-se Sandra e é, bem, era uma rapariga de bem com a vida, feliz, com ambições, enfrentado apenas os problemas de uma jovem mulher para a sua idade, 17 anos.  Era sexta-feira, 13 de Novembro de 1999, e Sandra tinha ido dar uma volta com os seus amigos ao parque da cidade do costume. Antes da meia - noite, separaram-se para ir para suas casas. Sandra não tinha de andar mais de 100 metros, mas esse espaço foi suficiente para acontecer uma tragédia. Foi abordada por um homem que a violou! Era um homem robusto, agressivo e cruel! A sua crueldade não teve castigo devido à escuridão da fria noite de Novembro. Sandra contou aos seus pais e o choque atingiu a sua família! Foram imediatamente à polícia e ao hospital e, para piorar a situação, veio a descobrir-se que estava grávida! Foi um ano de dor e o aborto que fez ainda a deixou mais transtornada. Passou a consultar um psicólogo e a sua vida mudou por completo… Durante uns dias, apenas se deitava no seu quarto e chorava, revoltada com a vida. Foram muitas as noites passadas em claro, com medo do escuro; quando finalmente adormecia derrubada pelo cansaço, acordava a suar devido aos pesadelos. Os gritos não lhe saiam da cabeça e aquelas mãos grosseiras e pecadoras tocavam-na todos os dias. Agonia!




Querido Diário,

Hoje deparei-me com uma situação que mexeu comigo e me deixou um pouco abalada.
Estava no hospital a atender uma paciente, quando entra uma miúda com os seus 16anos, desesperada, a gritar por ajuda. Entrei em pânico sem saber o que tinha acontecido. Quando ela disse que tinha sido violada, implorando que lhe fizesse um aborto, os meus sentidos pararam…
Perguntei-lhe se ela tinha consciência do que estava a dizer, mas ela mostrou-se decidida em abortar. Não a contrariei, pois não consigo imaginar o que ela podia estar a sentir.
É verdade que o aborto, hoje em dia, já pode ser feito até às doze semanas...felizmente! Depois de encaminhar a miúda para p gabinete do psicólogo e assistente social, contíguo ao meu, pus-me a pensar... Lembrei-me de uma história verídica que a minha avó me contava muitas vezes.
Tratava-se de uma rapariga, mais ou menos da mesma idade, que engravidara. Como a minha avó era parteira, pediram-lhe ajuda. Devido à falta de condições que havia na altura, ao provocar o aborto, a menina morreu. Lutou pela vida, pela sobrevivência, mas não foi forte o suficiente. A minha avó avisou-a de que não ia ser fácil. Não havia os devidos meios para que corresse bem a cem por cento. Não havia operações nem anestesias, nem sequer higiene suficiente. Não havia um simples comprimido, como há hoje, que, ao ser engolido, mata uma vida, por cruel que soe...
Volvidos tantos anos, ainda hoje me vem essa imagem a cabeça, quando me deparo com esta terrível imagem: uma criança inocente que se esfrega com as dores, numa cama coberta de lençóis, com um balde ao seu lado, enquanto a minha avó tentava limpar o sangue que lhe escorria pelo corpo…
É triste pensar nas pessoas que passaram por isto até há umas décadas atrás. Ainda bem que hoje há se pode realizar o aborto medicamente assistido, o que desdramatiza, de alguma forma, pelo menos em termos de saúde, a tragicidade do momento.
Bem, o dia de amanhã espera-me. Tive um dia bastante complicado e estou exausta, mas, felizmente, tudo acabou bem. A miúda, de apenas dezasseis anos, ganhou coragem para contar aos pais que a apoiaram na decisão já tomada. Pelo menos, não se sentirá tão só…
Amanhã trago-te mais notícias. Até lá!







01/05/2012

Querido Diário,

Oh meu Deus! Nem quero acreditar!... Estou com um atraso de 2 semanas e ainda não disse ao Nuno. Ontem discutimos e ele anda a evitar-me… Tenho medo que as minhas dúvidas se tornem certezas e se isso acontecer, não sei como vou contar ao Nuno e não sei a reacção dos meus pais. Amanhã tenho de fazer o teste (…)

03/05/2012

DEU POSITIVO! O que vai ser da minha vida?! Sou tão jovem, isto não podia ter acontecido! Acho que não tenho coragem para contar aos meus pais… a única opção é não ter esta criança! Isto parece um pesadelo, podia ter dúvidas mas já o confirmei 3 vezes! (…)

05/05/2012

Hoje o Nuno esperou-me á porta do colégio. Finalmente consegui dizer-lhe e a reacção não podia ter sido pior! Virou-me as costas e deixou-me lá a chorar! É óbvio que não quer ter este filho… acho que ele podia ter respeito por mim e por uma ‘’coisa’’ que é nossa. Afinal, somos ambos culpados e temos a mesma responsabilidade!

09/05/2012

Hoje o Nuno teve uma conversa muito estranha comigo! Falou-me de uns comprimidos para fazer o aborto. Ao início, fiquei feliz pois vou tirar este ‘’peso’’ de cima de mim, mas, depois, comecei a pensar e acho que já me estava a habituar á ideia de ter este bebé, pois está dentro de mim! E não quero matar um filho meu! Tenho medo e estou confusa … Não quero perder o Nuno …
13/05/2012

É já amanhã! Vou fazer o aborto. O Nuno disse para não me preocupar com o local pois ele tratava de tudo e que me ia buscar no fim das aulas! Estou nervosa… Tenho medo das consequências … Será que vou por a minha saúde em risco?! (…)

23/05/2012

Foi HORRIVEL! Aquele local, sem condições, um sítio que nunca vi nem nunca mais quero ver! Era uma casa velha, com uma cama antiga e um sofá pequeno… Aquele local era arrepiante!...Tomei o tal comprimido que o Nuno falou e comecei a sentir algumas dores, como se me estivessem a dar ‘’pancadas’’ na barriga! Depois destas dores, passou… já não estou grávida e cheguei a casa muito cansada…

26/05/2012

Continuando a minha ‘’história’’, os meus pais andavam desconfiados de algo, mas nunca descobriram. Quanto ao Nuno, depois de tudo e de todo o meu sofrimento, ignorou a minha dor e apercebi-me que era um amor falso senão não me fazia passar por isto ‘’sozinha’’. A nossa relação chegou ao fim, e este pesadelo também. Apesar de tudo, hoje, penso se foi a melhor opção. Como seria se aquela criança ainda existisse dentro de mim? Se ainda estivesse grávida, tinha hoje pouco mais de 1 mês… Aprendi uma grande lição! Afinal o amor não é tudo e não nos podemos deixar levar por impulsos … Devemos fazer tudo com responsabilidade e pensar sempre antes de agir.







O meu nome é Helena Salgueiro. Tenho 37 anos, sou casada há 10, tenho 2 filhos e vou contar o meu maior remorso.
Tudo começou no nosso 10º aniversário de casamento, apesar de o meu marido nem sequer se ter lembrado da data…
Ele é um empresário bem sucedido e dedicado ao seu trabalho, esquecendo-se, por vezes, de que tem uma família. Talvez por isso a minha vida se tenha tornado confusa e tenha cometido os erros que cometi.
O meu filho Ricardo tem 13 anos e é portador de trissomia 21, o que requer cuidados a tempo inteiro. A minha filha Raquel tem 9 anos e, graças a Deus, é perfeitamente saudável.
Visto o meu marido ter um salário deveras confortável, nunca houve a necessidade que eu trabalhasse, podendo, por isso, dedicar-me à casa a tempo inteiro.
Todas estas situações tiveram um certo peso para que eu começasse a adoptar outros comportamentos, não sendo esses dignos de uma mulher de família.
O Filipe. Ele tem 42 anos e é director de uma empresa de marketing. Conheci-o há uns anos, não me lembro bem como e, desde então, nunca mais perdemos contacto um com o outro, vendo-nos regularmente, tendo ele até jantado diversas vezes em minha casa.
Durante um desabafo acerca do meu cansaço devido à minha rotina familiar, começámos a ver-nos com um olhar diferente…
Foi mais forte que nós. Beijámo-nos, de beijos a sexo e de sexo passou a uma traição. Duradoura, por assim se dizer. Era o meu amante…
A minha menstruação estava atrasada e as minhas suspeitas confirmaram-se: estava grávida! Não sabia o que fazer. Quando soube, fiquei petrificada…
Chegámos a um consenso, eu e o Filipe. Ele nunca se despreocupou ou acobardou, embora soubesse que era errado assumirmos a relação e, pior ainda, ter um filho. Como tal, o aborto era a solução. Uma solução ilegal, mas era “ a solução”.
As minhas mãos estão ensanguentadas. Os lençóis estão ensanguentados. Deixei de sentir dor. Todos estes episódios são as memórias que se reproduzem nos meus espelhos mentais. Já não tenho medo. Julgo já nem sequer ter nada. Só o remorso…







A Parteira

Olhava com o olhar assustado e marejado de lágrimas aquele anjo ou diabo que a ia livrar de uma semente indesejada porque depositada no seu corpo num dia de muita champanha com a qual havia festejado o seu aniversário, os seus 18 anos…
Nem queria acreditar, quando, a tremer, entrou naquele quarto a cheirar a álcool, a lixivia, a desinfectante, de uma casa humilde no fim da rua do bairro onde ela própria vivia… Para ali entrou às escondidas, de noite, acompanhada pelo amigo de infância, agora pai da “coisa” que tinha dentro de si e desesperadamente devia tirar para acabar o martírio… Por ela, enfrentaria o céu e o inferno para criar o que, de há um mês a esta parte, já sentia ser seu, orgulhosamente seu, e desejava ver crescer…. Mas aquele que lhe havia servido copos de champanhe toda a noite, aquele que lhe havia afagado o ventre, o sexo e as lágrimas, não queria e ameaçava renegar o fruto que no seu ventre se desenvolvesse. Que mais poderia fazer…e no entanto…
Abriu as pernas, imitando a parteira que no seu regaço segurava uma bacia assustadora que acolheria o que dela saísse desfeito, então, em sangue criminoso... Tremia de medo, de emoção, de medo do pecado que cometia, com medo do castigo que sabia que Deus guardaria para si e antevendo o terror de não voltar a ter a oportunidade de sentir vida a borbulhar nas suas entranhas…
-Não tenhas medo... Isto não custa nada… É como limpar o rabo a meninos…- disse irónico e insensível o diabo- A tua mãe nunca saberá de nada- acrescentou o anjo manipulando uns instrumentos a que, numa espécie de alucinação, assemelhava a machados e pistolas…
Não! Ela não era uma assassina e tinha corpo para trabalhar e sustentar uma criança… A sua criança…. Mãe teria e o pai… quem sabe… com o tempo….
Estava resolvido! Olhou corajosa e desafiadoramente aquela mulher que pretendia anular a existência de um ser a troco de dinheiro, levantou-se, atirou para o chão a manta inunda que lhe cobria o sexo, ouviu o som de uma bacia a cair, abriu a porta e saiu, sem olhar para o amigo, o amante, o progenitor que, sentado na sala contígua, balbuciou perplexo:

- Já?!...

Sem comentários: