Excelente iniciativa do Centro de Estudos Transdisciplinares para o Desenvolvimento - um centro de investigação da UTAD, na área das ciências sociais - que decorreu durante a tarde da última sexta feira (21/01/11), no Auditório de Geociências, com conferência-debate sobre o Pacto de Estabilidade e Crescimento e o Pacto para o Emprego. Evento muito feliz, porque i) mostrou bem como as questões europeias são, hoje, questões nacionais – a situação nacional foi lida à luz das revisões por que tem passado, a nível europeu, o Pacto de Estabilidade e Crescimento e, ademais, quanto ao pacto para o emprego, ele também não deixou de ser perspectivado com as recomendações de instituições transnacionais, como a OIT, como pano de fundo; ii) os diferentes painéis foram compostos por pessoas muito bem preparadas e com opiniões divergentes: o debate foi, sobretudo, político, no melhor sentido da palavra: perante soluções diversas apontadas para o futuro da Europa, bem explicadas e sustentadas, torna-se mais fácil e consciente a escolha cidadã; iii) houve debate e argumentação, deixando-se os slogans, as tiradas fáceis, as graçolas, as frases assassinas, o remoque ad hominem próprio das campanhas eleitorais (que a serem o folclore vazio que têm sido, deviam acabar de uma vez por todas); iv) houve um público muito jovem e participativo, interessado e, mesmo, conhecedor; v)sintéticos e cumprindo horários, os moderadores contribuíram para o bom andamento dos trabalhos.
Esforço, de tipo jornalístico, de síntese, quanto ao que de mais interessante e importante disseram os diferentes actores: a) Elisa Ferreira, eurodeputada do PS, constatou que era à comissão europeia que competia velar pelo PEC, quando a Alemanha e a França o violaram, em 2004, e que levou á sua revisão, em 2005; o PEC devia conter, idealmente, três dimensões fundamentais: ajustar face ao que se passa(va) nas diferentes economias europeias; integrar uma dimensão anti-cíclica de que era (é) falho e flexibilizar os valores para o défice e/ou dívida (já que estes se apresenta(va)m imutáveis, acontecesse o que acontecesse). O problema de tal rigidez é que, hoje por hoje, somente o Luxemburgo cumpre, escrupulosamente, ambos os critérios (3% do PIB, relativamente ao défice; 60%, quanto á dívida). Tende-se, neste tempo, não a infirmar a revisão do PEC, operada em 2005, mas a incrementá-la: a dimensão preventiva a prevalecer, com preocupação de reforçar o acompanhamento da dívida (durante muito tempo subalternizada face ao défice); recuperou, Elisa Ferreira, o Geovanini report, de 1993 (e quantos já alguma vez ouviram dele falar, no ruído do efémero, por que todos passamos?), que, já à época, propunha que y) houvesse entreajuda de países face a ataques – financeiros – externos; yy) emissão conjunta de dívida soberana; yyy) países na mesma moeda a terem de ser suportados por um Orçamento Europeu (a comparação foi feita com os EUA, nesta conferência) – orçamento que corresponde a 1% do PIB europeu, demasiado modesto, pois. Curiosamente, naqueles inícios dos anos 90, eram os pequenos países a pensar que se houvesse tais mecanismos – e até redistributivos no interior da União, de região para região, consoante o grau de riqueza – poderiam estes, os pequenos Estados, vir a ser abafados pelos países mais poderosos. Para a eurodeputada socialista, a UE trabalhou, diferentemente, o equilíbrio nominal do défice e da dívida – em que se concentrou – e o crescimento económico – que descurou. Os desequilíbrios internos da união são, a seu ver, a para deste descurar do crescimento económico, os maiores problemas do nosso espaço geopolítico.
Para b) o Prof.Lebre de Freitas, da Univ. de Aveiro, com um posicionamento mais liberal no plano económico, a primeira pergunta a fazer é se precisamos mesmo de um Pacto de Estabilidade e Crescimento (pergunta carregada de ironia, em virtude da sucessiva violação, do mesmo). Em segundo lugar, e face à possibilidade de multas para os países que apresentem desequilíbrios macroeconómicos, no seio da UE, como sugerira, Elisa Ferreira, vir a suceder, Lebre de Freitas questionou se os governos, sem margem para corrigir, ainda seriam, ulteriormente, penalizados. O limite de 3% para o valor do défice foi já violado 97 vezes, e apenas em 29 dos casos os países estavam em recessão. O que sugere laxismo dos governos. Por outras palavras, sustentou, o PEC não foi levado a sério. Há muita gente a dever dinheiro e, como a China é pequena para prover a todos, começa a haver dúvidas acerca dos pagamentos das dívidas. Reconhece o académico que a instituição orçamental é credível, em Portugal. Mas novos problemas se levantam com as nossas pensões de reforma, e, com a desconfiança de que mais países possam vir a ser incumpridores, as taxas de juro poderão vir a ser incomportáveis. A entrada do FMI em Portugal, para Lebre de Freitas, teria a vantagem de impor um condicionamento que poderia servir para viabilizar reformas difíceis – não deixou de aludir ao despedimento de funcionários públicos; muitas vezes, a terminologia utilizada em debates mais partidarizados tende a ser opaca e aqui foi concretizada: reformas difíceis têm, no actual contexto, este significado - e de oferecer um plano de financiamento. O risco para o euro, advogou, não decorre de uma falta de ajuda da Alemanha, antes de um excesso de auxílio por parte desta que, no limite, poderá fazer com que os alemães – a rua alemã, se preferirem - o rejeitem em favor do marco. Posição de imediato contraditada por Elisa Ferreira: os bancos alemães foram quem mais ganhou com o mercado interno e a moeda única; os bancos alemães têm muita dívida dos países envolventes (além de dívida privada); principalmente: se a Alemanha regressasse ao marco, a supremacia da sua moeda sobre as demais seria tal, que perderia competitividade sobremaneira (estamos a pensar nas exportações). Elisa Ferreira adiantou, ainda, que os japoneses já se mostraram interessados em financiar uma boa parte da zona euro (e a juros razoáveis). Um grupo formado por Mário Monti, Tremonti e Juncker propôs uma solução de mais longo prazo, com a consolidação a fazer-se com 50-60% da dívida de todos os países da UE a ser junta em Eurobonds e a estar no mercado internacional, o que iria perfazer um valor na ordem dos seis triliões de euros, recorrendo-se a um empréstimo obrigacionista. Isto iria impor regras muito apertadas aos países, na mesma linha de longo prazo. Esta ideia era recusada pela Alemanha, mas volta a estar agora em cima da mesa. Quando estabelecemos comparações com outros países a nível de competitividade – isto, de um ponto de vista da união europeia face às restantes potências mundiais – não podemos perder de vista a questão da paridade cambial (e como esta foi negociada, quando o euro surgiu); o dumping salarial chinês; as regras ambientais (cumpridas, com um dado custo, numa dada latitude; incumpridas em outras geografias). Focado no plano nacional, Lebre de Freitas recordou uma sua recente visita à consultora Ernst Young, numa conferência, em que pôde observar que as respostas dos empresários para o não investimento em Portugal passavam por dois factores críticos: a justiça, e a incerteza fiscal. O novo-riquismo plasmado no abandono do calçado, dos têxteis, etc. foi outra pecha portuguesa, na sua inserção na comunidade europeia, anotou a eurodeputada.
Assim, as principais notas pessoais acerca da primeira mesa-redonda deste debate aberto, promovido, em boa hora, pelo CETRAD e a que regressaremos no próximo reparo.
Boa Semana
Pedro Miranda
Esforço, de tipo jornalístico, de síntese, quanto ao que de mais interessante e importante disseram os diferentes actores: a) Elisa Ferreira, eurodeputada do PS, constatou que era à comissão europeia que competia velar pelo PEC, quando a Alemanha e a França o violaram, em 2004, e que levou á sua revisão, em 2005; o PEC devia conter, idealmente, três dimensões fundamentais: ajustar face ao que se passa(va) nas diferentes economias europeias; integrar uma dimensão anti-cíclica de que era (é) falho e flexibilizar os valores para o défice e/ou dívida (já que estes se apresenta(va)m imutáveis, acontecesse o que acontecesse). O problema de tal rigidez é que, hoje por hoje, somente o Luxemburgo cumpre, escrupulosamente, ambos os critérios (3% do PIB, relativamente ao défice; 60%, quanto á dívida). Tende-se, neste tempo, não a infirmar a revisão do PEC, operada em 2005, mas a incrementá-la: a dimensão preventiva a prevalecer, com preocupação de reforçar o acompanhamento da dívida (durante muito tempo subalternizada face ao défice); recuperou, Elisa Ferreira, o Geovanini report, de 1993 (e quantos já alguma vez ouviram dele falar, no ruído do efémero, por que todos passamos?), que, já à época, propunha que y) houvesse entreajuda de países face a ataques – financeiros – externos; yy) emissão conjunta de dívida soberana; yyy) países na mesma moeda a terem de ser suportados por um Orçamento Europeu (a comparação foi feita com os EUA, nesta conferência) – orçamento que corresponde a 1% do PIB europeu, demasiado modesto, pois. Curiosamente, naqueles inícios dos anos 90, eram os pequenos países a pensar que se houvesse tais mecanismos – e até redistributivos no interior da União, de região para região, consoante o grau de riqueza – poderiam estes, os pequenos Estados, vir a ser abafados pelos países mais poderosos. Para a eurodeputada socialista, a UE trabalhou, diferentemente, o equilíbrio nominal do défice e da dívida – em que se concentrou – e o crescimento económico – que descurou. Os desequilíbrios internos da união são, a seu ver, a para deste descurar do crescimento económico, os maiores problemas do nosso espaço geopolítico.
Para b) o Prof.Lebre de Freitas, da Univ. de Aveiro, com um posicionamento mais liberal no plano económico, a primeira pergunta a fazer é se precisamos mesmo de um Pacto de Estabilidade e Crescimento (pergunta carregada de ironia, em virtude da sucessiva violação, do mesmo). Em segundo lugar, e face à possibilidade de multas para os países que apresentem desequilíbrios macroeconómicos, no seio da UE, como sugerira, Elisa Ferreira, vir a suceder, Lebre de Freitas questionou se os governos, sem margem para corrigir, ainda seriam, ulteriormente, penalizados. O limite de 3% para o valor do défice foi já violado 97 vezes, e apenas em 29 dos casos os países estavam em recessão. O que sugere laxismo dos governos. Por outras palavras, sustentou, o PEC não foi levado a sério. Há muita gente a dever dinheiro e, como a China é pequena para prover a todos, começa a haver dúvidas acerca dos pagamentos das dívidas. Reconhece o académico que a instituição orçamental é credível, em Portugal. Mas novos problemas se levantam com as nossas pensões de reforma, e, com a desconfiança de que mais países possam vir a ser incumpridores, as taxas de juro poderão vir a ser incomportáveis. A entrada do FMI em Portugal, para Lebre de Freitas, teria a vantagem de impor um condicionamento que poderia servir para viabilizar reformas difíceis – não deixou de aludir ao despedimento de funcionários públicos; muitas vezes, a terminologia utilizada em debates mais partidarizados tende a ser opaca e aqui foi concretizada: reformas difíceis têm, no actual contexto, este significado - e de oferecer um plano de financiamento. O risco para o euro, advogou, não decorre de uma falta de ajuda da Alemanha, antes de um excesso de auxílio por parte desta que, no limite, poderá fazer com que os alemães – a rua alemã, se preferirem - o rejeitem em favor do marco. Posição de imediato contraditada por Elisa Ferreira: os bancos alemães foram quem mais ganhou com o mercado interno e a moeda única; os bancos alemães têm muita dívida dos países envolventes (além de dívida privada); principalmente: se a Alemanha regressasse ao marco, a supremacia da sua moeda sobre as demais seria tal, que perderia competitividade sobremaneira (estamos a pensar nas exportações). Elisa Ferreira adiantou, ainda, que os japoneses já se mostraram interessados em financiar uma boa parte da zona euro (e a juros razoáveis). Um grupo formado por Mário Monti, Tremonti e Juncker propôs uma solução de mais longo prazo, com a consolidação a fazer-se com 50-60% da dívida de todos os países da UE a ser junta em Eurobonds e a estar no mercado internacional, o que iria perfazer um valor na ordem dos seis triliões de euros, recorrendo-se a um empréstimo obrigacionista. Isto iria impor regras muito apertadas aos países, na mesma linha de longo prazo. Esta ideia era recusada pela Alemanha, mas volta a estar agora em cima da mesa. Quando estabelecemos comparações com outros países a nível de competitividade – isto, de um ponto de vista da união europeia face às restantes potências mundiais – não podemos perder de vista a questão da paridade cambial (e como esta foi negociada, quando o euro surgiu); o dumping salarial chinês; as regras ambientais (cumpridas, com um dado custo, numa dada latitude; incumpridas em outras geografias). Focado no plano nacional, Lebre de Freitas recordou uma sua recente visita à consultora Ernst Young, numa conferência, em que pôde observar que as respostas dos empresários para o não investimento em Portugal passavam por dois factores críticos: a justiça, e a incerteza fiscal. O novo-riquismo plasmado no abandono do calçado, dos têxteis, etc. foi outra pecha portuguesa, na sua inserção na comunidade europeia, anotou a eurodeputada.
Assim, as principais notas pessoais acerca da primeira mesa-redonda deste debate aberto, promovido, em boa hora, pelo CETRAD e a que regressaremos no próximo reparo.
Boa Semana
Pedro Miranda
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